terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

MUDA O 'MIX' DO CRÉDITO NOS BANCOS

jornal Valor Econômico 10/02/2010 - Fernando Travaglini
A expectativa de um crescimento do PIB acima de 5% combinada com a demanda reprimida das empresas ao longo de boa parte do ano passado são os ingredientes para uma mudança no "mix" das carteiras de crédito dos grandes bancos privados. À medida que as instituições financeiras registram menores índices de calote, o nível de confiança avança e o foco volta a apontar para o segmento de empresas.

Tanto Itaú Unibanco - que publicou ontem lucro de R$ 10 bilhões - quanto Bradesco divulgaram perspectivas de crescimento do estoque de crédito para as empresas, especialmente pequenas e médias, acima dos níveis esperados para o crédito ao consumo neste ano.

O Itaú Unibanco vê crescimento total da carteira de crédito em 20%, mas acredita em avanço menor, de 16% a 17%, entre as pessoas físicas. Já o Bradesco prevê evolução de até 25% das suas operações de empréstimo, com o consumo ficando entre 16% e 20%, enquanto pequenas e médias pode atingir vigorosos 32% de expansão em 2010.

Essa mudança já pode ser vista nos números dos balanços do quarto trimestre. No Santander, o segmento de pequenas e médias avançou 4,5% e de grandes empresas, 7,7%. No Itaú, o estoque para as pequenas e médias avançou 7,6%, nos últimos três meses do ano e a tendência se mantém nas primeiras semanas do ano, diz Silvio de Carvalho, diretor-executivo do banco. "O primeiro trimestre não é muito ativo, mas a demanda, na nossa visão, vai ser maior do que nos anos anteriores", disse, ontem, em teleconferência com a imprensa.

O Bradesco também sente movimento semelhante. "Estamos com muita demanda por investimento", afirmou Domingos de Abreu, vice-presidente da instituição, quando da divulgação dos resultados, há duas semanas.

De acordo com o presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco Cappi, o crescimento acelerado da economia, acima de 5%, leva a uma necessidade maior de recursos para investimento e para capital de giro por parte das companhias e isso deve puxar o desempenho do país. "Se o motor num primeiro momento (da retomada) foi o consumo, o motor em 2010 vai ser o investimento", diz.

Além da maior demanda das empresas, Trabuco ressaltou que o crédito para consumo pode ter uma leve desaceleração em relação ao ritmo pré-crise por conta de uma base maior, acumulada nos últimos anos de forte crescimento, mas também pelo grau de endividamento das famílias. "A pessoa física tem um limite que é dado pela sua capacidade de pagamento e pela própria renda", alertou.

A própria evolução da economia real deve ditar um ritmo menos acelerado para alguns segmento, como é o caso das carteiras de financiamento de veículos, que hoje representam um terço do total do mercado de pessoas físicas. O Bradesco, por exemplo, espera um avanço entre 10% e 14%, abaixo dos 32% a 36% projetados para os empréstimos consignados.

A grande vedete no consumo continua sendo o crédito imobiliário. O Itaú espera avanço de 40% da carteira, enquanto o Santander, que detém hoje o maior estoque entre os privados (R$ 9,086 bilhões), também vê o segmento como um dos que devem ter bom desempenho neste ano.

Essa mudança no mix da carteira, com volta mais forte da oferta de linhas para pequenas e médias empresas, mostra a retomada da confiança dos bancos em conceder crédito. Afinal foi esse o segmento que deu mais dor de cabeça para as instituições durante a crise com a aceleração dos calotes.

A inadimplência das companhias atingiu um pico de 4% no meio do ano passado, o dobro do patamar pré-crise e muitos bancos tiveram de renegociar boa parte dos contratos. "A tendência é de melhora", diz Fábio Barbosa, presidente do Santander.

O cenário é mais promissor e os bancos estão sentados em provisões adicionais bastante representativas, de R$ 10 bilhões, somando os três privados. Segundo Carvalho, do Itaú, o banco está preparado para enfrentar um eventual ciclo de volatilidade da economia.

Crise, explosão de inadimplência, retração do crédito e ofensiva dos bancos públicos. Nada disso foi suficiente para reduzir os ganhos das instituições financeiras privadas, que mantiveram em 2009 seus lucros nos mesmos patamares do ano anterior. Somados, Itaú Unibanco, Bradesco e Santander atingiram quase R$ 20 bilhões de lucro líquido (R$ 19,884 bilhões), com avanço de 3,5%.

Para este ano, as perspectivas são bem mais favoráveis, o que deve indicar resultados ainda melhores. O mix da carteira com maior avanço entre as empresas médias deve garantir maiores margens, comparado aos spreads de grandes companhias, além da queda das despesas com calote, dada a melhora da carteira.

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